quinta-feira, 27 de outubro de 2011

CONTEXTO HISTÓRICO-LITERÁRIO


BARROCO

CONTEXTO HISTÓRICO-LITERÁRIO.

No entender de alguns estudiosos, o Barroco tornou-se a arte da Contra-Reforma, visto as características básicas do movimento estético servirem aos desígnios doutrinários e pedagógicos da Igreja na luta anti-reformista. A Contra-Reforma teria absorvido a estética barroca, fazendo dela uma espécie de estratégia de sua ação catequizadora, de onde o caráter pragmático assumido pelas expressões da arte literária barroca, particularmente as em prosa. Por outro lado, a fusão de propósitos e tendências nem sempre coerentes explica as múltiplas facetas apresentadas pelo Barroco. Posto isso, pergunta-se; quais as características fundamentais da estética barroca? Primeiro de tudo, corresponde à tentativa de fundir, numa unidade ambiciosa de simbolizar a suma perfeição, as duas linhas de força que conduziram o pensamento europeu ao longo do século XVI: o Barroco procurou conciliar numa síntese utópica a visão do mundo medieval, de base teocêntrica, e a ideologia clássica, renascentista, pagã, terrena e antropocêntrica. No amálgama entre orientações tão opostas e à primeira vista mutuamente repulsivas, haveria inevitável troca de posições, de forma que se operaria a espiritualização da carne e a correspondente carnalização do espírito. Em resumo, era o empenho no sentido de conciliar claro e escuro, a matéria e o espírito, a luz e a sombra, visando a anular pela unificação a dualidade do ser humano, dividido ente os apelos do corpo e os da alma. (MOISÉS, Massaud. A Literatura Portuguesa. Pág. 72-73. Cultrix: São Paulo, 2005).

Ainda sobre o Barroco.

Conhecido também por Seiscentismo (anos de 1600), este foi um estilo literário marcado pela linguagem rebuscada, o uso de antíteses e de paradoxos que expressavam a visão de mundo barroca numa época de transição entre o Teocentrismo e o Antropocentrismo. No Barroco, estão presentes duas vertentes: cultismo e conceptismo:
Cultismo ou gongorismo - valorização de forma e imagem, jogo de palavras, uso de metáforas, hipérboles, analogias e comparações. Manifesta-se uma expressão da angústia de não ter fé.
Conceptismo ou quevedismo - valorização do conteúdo/conceito, jogo de idéias através do raciocínio lógico. Há o uso da parábola com finalidade mística e religiosa.

Referências históricas: Recuo das renovações culturais trazidas pelo Renascimento; Reforma Protestante combatida através da Contra-Reforma e da inquisição; Domínio espanhol de Portugal de 1580 até 1640.

Características: Essa situação contraditória provoca o aparecimento de uma arte que expressar também atitudes contraditórias do artista em face do mundo, da vida, dos sentimentos e de si mesmo.
O homem tenta conciliar a glória e o valor humano despertados pelo Renascimento com as idéias de submissão e pequenez diante de Deus e a igreja.
O homem está entre céu e terra, consciente de sua grandeza, mas perseguido pela idéia de pecado e busca a salvação de forma angustiada. Assim, há uma tentativa de conciliação de idéias antagônicas: Bem – Mal / Deus – Diabo / Céu – Terra / Pureza – Pecado / Alegria – Tristeza / Espírito – Carne.
Há um crescente pessimismo em face da vida (oposto à vontade de viver e vencer do Renascimento) e tudo lembra ao homem sua morte e aniquilamento. É de se esperar que os recursos dessa visão de mundo sejam, na poesia, as figuras: sonoras (aliteração, assonância, eco, onomatopéia...), sintáticas (elipse, inversão, anacoluto, silepse...) e principalmente semânticas (metáfora, metonímia, sinédoque, antítese, paradoxo, clímax...).

Gregório de Matos Guerra (1623-1696).

Sua própria produção poética — lírica, religiosa, satírica e existencial — já mostra a alma barroca deste poeta. Ao lado de expressões de amor carnal, manifestou aspirações religiosas; ao lado de poesias sérias e reflexivas sobre a condição humana, debochou e satirizou a sociedade da época, notadamente a baiana. A dualidade barroca percorre toda a obra de Gregório de Matos, vazada numa linguagem bem trabalhada, capaz de traduzir sua angústia metafísica e religiosa, sutil para expressar seus sentimentos amorosos e objetiva e popular nas sátiras.

Tinha por apelido "Boca do Inferno", devido ao teor de seus poemas. Sua poesia religiosa é sempre do pecador que se penitencia através de uma lógica argumentativa; enquanto a poesia lírica é sensualista e elogiosa. Em Salvador, levou vida desregrada, tendo famosos encontros amorosos com freiras e compondo poemas satíricos, por isso foi banido em 1694 para Angola. Nunca em vida Gregório de Matos publicou um livro, e suas poesias, colecionadas e publicadas apenas por seus admiradores, sobrevive até hoje em antologias.

A linguagem Barroca

Algumas características da linguagem barroca merecem especial atenção pela sua peculiaridade e pelo uso que foi sendo feito de algumas delas em escolas posteriores.

REQUINTE FORMAL (OBSCURIDADE): você deve notar que o nível lingüístico dos textos é sofisticado, ou seja, suas construções sintáticas são elaboradas com vocábulos de nível elevado. O Barroco literário foi uma arte da aristocracia e esse refinamento era desejado por seu público consumidor, porque lhe conferia status:

É nau enfim, que em breve ligeireza,
Com presunção de Fênix generosa,
Galhardias apresta, alentos preza.
Veja que as palavras empregadas por Gregório são pouco usuais, não estão no dia-a-dia, e essa é uma das marcas do requinte formal.

FIGURAÇÃO (SIMILARIDADES): em vez de dizer as coisas de forma direta e objetiva, o texto barroco prefere a figuração, a sugestão por meio de metáforas, de comparações, símbolos e alegorias.
Ontem a vi por minha desventura
Na cara, no bom ar, na galhardia
De uma mulher, que em Anjo se mentia;
De um sol, que se trajava em criatura(...)

Aqui a mulher é comparada ao Sol (estimula o ardor) e ao Anjo (símbolo da pureza).
CONFLITO ESPIRITUAL
(FUSIONISMO/DUALISMO): o homem barroco sente-se dilacerado e angustiado diante da alteração dos valores, dividindo-se entre o mundo espiritual e o mundo material As figuras que melhor expressam esse estado de alma são a antítese e o paradoxo .
Se basta a vos irar tanto pecado
A abrandar-vos sobeja um só gemido
Que a mesma culpa, que a vos ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.

Observe que o poeta argumenta que o pecado é paradoxalmente o motivo da ira e da alegria de Deus TEMAS CONTRADITÓRIOS (JOGO DE CLARO/ESCURO): há o gosto pela confrontação violenta de temas opostos, como amor/dor, vida/morte, juventude/velhice, pecado/perdão, etc.

Lugar de glória, adonde estou penando
Casa da morte, adonde estou vivendo!

ou

Mas vejo, que por bela, e por galharda,
Posto que os Anjos nunca dão pesares,
Sois Anjo, que me tenta, e não me guarda.

Visão que o poeta tem da terra, local de sofrimento, mas também de luz. Isso reforça o aspecto contraditório da poesia barroca na qual figura feminina é vista como um ser ambíguo, que realiza simultaneamente uma sedução mística (religiosa) e carnal (profana).

A EFEMERIDADE DO TEMPO E O CARPE DIEM: o homem barroco tem consciência de que a vida terrena é efêmera, passageira, e por isso, é preciso pensar na salvação espiritual.
Mas, já que a vida é passageira, sente, ao mesmo tempo, desejo de gozá-la antes que acabe, o que
resulta num sentimento contraditório, já que gozar a vida implica pecar, e, se há pecado, não há salvação. Diante disso, nota-se um horror diante da passagem do tempo.

Goza, goza da flor da mocidade,
Que o tempo trota a toda ligeireza,
E imprime em toda flor sua pisada.

Nesse trecho há o convite à amada para que ela aproveite a vida enquanto está jovem

QUADRO COMPARATIVO
CLASSICISMO RENASCENTISTA
BARROCO
Retomada dos padrões clássicos da Idade Antiga, a partir da segunda metade da Idade Média, no período que se chamou de Renascimento.
Prolongamento radical das idéias do Maneirismo, já no século XVII.
Contenção, racionalismo.
Exagero; ludismo; grotesco .
Simplicidade e clareza.
Tendência para o rebuscamento ornamental e para a artificialidade.
Prevalece como gênero o épico.
Prevalecem a lírica e a sátira.
Referência constante à mitologia greco-romana.
Referência constante aos dogmas da Igreja cristã (pecado, céu, inferno, eternidade etc.).

Equilíbrio, sobriedade.
Dúvida, desequilíbrio, obscuridade, confusão, ambigüidade em exagero.
Sensualidade quase imperceptível, muito velada.
Sensualidade praticamente explícita, chegando ao erótico.
Autoconfiança.
Autoconfiança em contraste com o sentimento de frustração.
Racionalismo formal.
Racionalismo formal.


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